Um conflito com a minha querida irmã? Impossível, pensei eu. Errado! Tive um forte desentendimento há pouco após décadas em paz. O conflito serviu-me como inspiração para o meu artigo n.º 23 da coluna “Prevenção e Mediação de conflitos”. Foi publicado na Vida Económica de 2 de junho de 2023.

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Prevenção e Mediação de conflitos
Conflitos entre irmãos e irmãs: quanto mais cedo os resolver, melhor!

Não tinha consciência de que havia tantos conflitos entre irmãos e irmãs. Uns já não se falam, outros discutem em cada encontro familiar e ainda há os que estão em tribunal pela herança da mãe. Foi o desentendimento recente com a minha irmã que voltou a despertar o meu interesse pelo tema. Vou aqui abordá-lo para refletir sobre como podemos criar, manter ou recuperar uma boa relação com os nossos irmãos e irmãs e contribuir para que os nossos filhos e filhas criem laços firmes e saudáveis, ou seja, de confiança e amor incondicional, apesar da concorrência natural pelo amor e pelo reconhecimento do pai e da mãe.

O conflito com a minha irmã é um excelente exemplo como um conflito não pode abalar uma relação sólida – desde que se debata o assunto numa conversa franca e orientada para a solução, tal e qual como numa mediação. Como nasceu então o conflito com a minha irmã com a qual não discutia há décadas, apesar de defendermos frequentemente opiniões diferentes? A discussão foi forte, cada uma de nós sentiu o seu ego posto em causa. Como aconteceu? No fim de uma tarde de trabalho, lembrei-me que, no dia seguinte, antes do dentista, poderia dar um saltinho a uma nova ourivesaria de joias “com história”. Ponderei vender uma corrente de ouro da minha mãe falecida em 2015 e investir o dinheiro numa escapadinha com as minhas filhas e o meu filho. Sabia que a minha mãe positiva e pragmática teria adorado a solução, já que a corrente de um relógio de bolso, que ela tinha usado como colar, não me dizia nada e estava na gaveta há anos, sem uso. Então liguei espontaneamente à minha irmã. Ainda em modo de despachar coisas, fui direto ao assunto e pedi-lhe o certificado da corrente. A fatura veio logo com toda a força. Primeiro às facadas, depois aos gritos, a minha irmã disparou: «Problemas financeiros?», «Não podes fazer isso, nunca!», etc. Acabei a conversa rapidamente porque, com a adrenalina em alta, os ouvidos tapam-se e a capacidade de raciocínio reduz-se. Dei uma volta com a minha cadela e já não ouvi a mensagem de voz furiosa da minha irmã no telemóvel.

O telefonema no dia seguinte correu muitíssimo mal: eu a argumentar a um nível racional e a minha irmã a um nível emocional, ainda muito ferida. Quando ela puxou o trunfo de ter falado com o nosso pai sobre o assunto, passei-me: fazer queixinhas e envolver terceiros, considero uma péssima atitude. Acabámos a conversa em conflito aberto: ela a achar-me fria e cruel, eu a achá-la invasiva, inflexível e limitada.

Cerca de duas semanas depois (tinha tido logo uma boa conversa esclarecedora com o nosso pai), noutro fim da tarde, decidi ligar à minha irmã: «Ainda estás chateada comigo?» Desta vez, sim, conseguimos comunicar através do mesmo canal, o canal racional, o único onde se resolvem os conflitos. Num papel duplo de medianda e mediadora, conduzi a conversa. Consegui transmitir que as coisas tinham um valor monetário, definido pelo mercado, e ainda um valor emocional, atribuído por nós. Ela conseguiu transmitir que o valor emocional das joias da nossa mãe era enorme para ela. Apesar de sentimentos diferentes, conseguimos entender e assim respeitar a posição uma da outra. E mais: reconfirmamos mutuamente o nosso amor incondicional. Somos muito diferentes, mas gostamos muito uma da outra.

É importante resolver os conflitos a tempo. O silêncio leva a um afastamento e este destrói a confiança e o amor.