Há tantas pessoas que se queixam sobre o mau clima de trabalho, mas quantas delas refletem sobre o próprio papel? Este é o tema do novo artigo de Silke Buss, publicado na Vida Económica de 25 de agosto de 2023. É o 26.º artigo da sua coluna “Prevenção e Mediação de conflitos”.
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Prevenção e Mediação de conflitos
Cada um é o artesão do seu próprio destino
“O meu chefe não gosta de mim, o que posso fazer?” No fim de um workshop de comunicação, uma participante pediu-me um momento em privado. Perguntei-lhe como sabia que não gostava dela. “Somos seis pessoas no escritório e quando o chefe entra de manhã para dar a sua volta de bons dias, sou sempre a última a ser cumprimentada.” Coloquei mais algumas perguntas para obter uma imagem completa da cena matinal e fiz uma descoberta surpreendente, surpreendente sobretudo porque a participante não estava a compreender o seu papel ativo na cena: Era a única a não olhar para o chefe quando entrava. Perguntei-lhe a quem se dirigiria primeiro se entrasse numa sala com três pessoas, a primeira das quais continuava focada no ecrã do PC, a segunda a olhar para ela de forma neutra e a terceira a sorrir para ela. A crença da minha interlocutora começou a abalar. Compreendeu que a sua comunicação não verbal podia ser interpretada pelo chefe como desinteresse, insegurança, antipatia e muito mais. Recomendei-lhe refletir sobre os vários contactos que teve com o chefe e fazer uma análise geral e detalhada da sua própria comunicação verbal e não-verbal e as interpretações e reações que possam espoletar. Causa, efeito. O que pode mudar, como contribuir para uma relação mais positiva? Assumir uma postura mais ativa, mais positiva? Ela está empenhada, é trabalhadora e veste a camisola da empresa, mas será que o chefe sabe disso? Quais as formas possíveis de lhe transmitir o seu contributo?
A passividade de um colaborador ou de uma colaboradora é um dos comportamentos mais irritantes para a chefia. Pode ser interpretada como indiferença e por vezes é. No entanto, é muito maior a probabilidade de resultar de insegurança ou de padrões aprendidos numa educação top-down (se eu me adaptar e não der nas vistas, o chefe não me chateia e o meu posto de trabalho está seguro).
Já estou a antecipar os protestos de alguns leitores e de algumas leitoras: Mas não é tarefa do chefe de falar com a colaboradora que não olha quando entra na sala e, mesmo quando chega à secretária dela, foge um pouco do olhar direto? Claro! Se este chefe tivesse capacidade de liderança, já teria procurado a conversa. O facto de não o ter feito mostra que lhe falta esta qualidade. Ou não se apercebeu do comportamento invulgar da sua colaboradora ou o punha de lado ou não sabia o que fazer – qualquer que seja o motivo da sua passividade, é sempre sinal de má liderança e de défices na capacidade de comunicação. Uma vez que o bem-estar de cada elemento da sua equipa é fundamental para a produtividade e o sucesso da empresa, devia ter esclarecido a situação. O que está por trás do comportamento da colaboradora? Está tudo bem com ela? Sente-se bem no trabalho, apoiada, motivada? Até pode ser que o comportamento tenha pouco ou nada a ver com o trabalho, mas é preciso esclarecer.
Porque é que recomendei então à colaboradora que reflita sobre a situação e veja o que pode fazer? Simples: porque aconselho ação à cada pessoa. Se não estou satisfeita e quero melhorar a relação com alguém, pergunto-me o que posso fazer, o que está ao meu alcance. Não fico à espera ou parto do princípio de que seria ou poderia ser tarefa de outro ou de outra, simplesmente coloco o foco no que quero atingir. Ora, a colaboradora identificou uma situação desagradável – tinha a impressão de que o chefe não gostava dela – tão importante para ela que me pediu conselho. Para melhorar uma situação desagradável, primeiro é preciso refletir e separar os factos das interpretações e, a seguir, entrar em ação. Em suma, a famosa citação de Appius Claudius Caecus (340 a 273 a.C.), que é o lema principal da educação que recebi e que dei, cunha esta atitude numa única frase. O político romano e construtor do primeiro grande aqueduto a abastecer Roma disse: “Faber est suae quisque fortunae – Cada um é o artesão do seu próprio destino”.
Gosta? Se concordar e se esta máxima ainda não for sua, que tal escrevê-la num post-it e colocá-la num sítio bem visível?